sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

163.




Uma vez disse-me " Ás vezes tem-se de ceder um bocadinho". Balbuciei para dentro as palavras que não disse e repeti entre dentes, até as letras sangrarem: Tem-se. Dei-me conta perdida na vastidão do ter e apercebi-me que este é tão vago quanto o tempo. Tem-se. Quem de facto tem? Que fardos são esses, mais pesados do que o pavor que Hamlet sentia pelo desconhecido, que nos emaranham os movimentos? 
Ter-se é pesar-nos nas costas, é prender-nos a alma com arames farpados, é ser-se tão cretino quanto a humanidade e tão vazio quanto as ruas de Lisboa em hora de ponta - a abarrotar de gente e a carecer de ser. Por instantes, deixamo-nos no outro lado do passeio até que... nos perdemos. 
Deixamos, então, de ser. Já não se é. Porque, bem, ultimamente tem-se. E tem-se é sempre tão pouco.

2 comentários:

Anónimo disse...

Estive ausente durante largos dias.
Que conforto é voltar a ler-te e, ver, afinal, que continuas eternamente soberba.

*

Ligações disse...

opa, adoro...