segunda-feira, 16 de julho de 2012

188.


Foge-me o céu e eu peço que fiques, que suportes toda esta fome de infinito um pouco mais. Lá fora, orquídea, - digo-lhe - as paredes do mundo não aguentam tamanha densidade emocional. Sacode-se para trás, num movimento meio frouxo a cheirar a litoral morto, retira o amor congelado do bolso e segura-o com as mãos, junto ao peito, - magoando-o quase tanto quanto a mim - e derrete e derrete e derrete até que das suas doces palmas já só se consegue ver gotejar um líquido sôfrego. "Parece os teus olhos quando choram", digo-lhe. Nessa altura é a maresia que me foge, junto do amor que não mais forma tem. E aí a minha pequena orquídea já só me resta na memória, onde a conservo de cabelos cor de poesia desalinhados, recordando-me das tardes em que o vento dançava no seu rosto de pétala e nada parecia ser junto do frenesim de gestos azuis e fragilidades retraídas que ela mesma emanava. Começa agora o coração a fugir-me, "As apanhadinhas não podiam ficar para outra altura?" - pergunto-lhe. O silêncio arde tanto que me vejo nesse enorme abismo de mastigar palavras até perderem sentido, depois de já tudo ter perdido. Começo a soluçar do mesmo modo que a amo - aos solavancos - e percebo que me não fica nada sempre que ela parte, como se precisasse sempre de minha orquídea para fazer uso do mundo.

9 comentários:

Anónimo disse...

cá está o anónimo de sempre. a tuas palavras reconfortam as noites frias que se passa sozinho, inspirando-me em ti, anónimo. p.s. amo-te.

Maria disse...

Amores assim gosto eu, parecem suspiros no coração, um chá quente para a alma. Obrigada!

Anónimo disse...

É como nos aliviar a dor de cada dia. escreve tão bem Maria, um dia gostava de sentir a sua presença activa, sentir a sua voz. Porque se a voz for tão boa como as palavras são, é a mulher perfeita. Obrigado eu!

mary disse...

oh Maria, enchi-me de alegria agora. eu andava há anos (juro, anos!) a tentar entrar no teu blogue, e nunca conseguia. aparecia o aviso de conteúdo para adultos, omg estranho. mas hoje consegui, finalmente, e fiquei fresca com a tua escrita.
sublime.

Anónimo disse...

Nós que vivemos dos sonhos e do que é realmente importante. Nós que não ligamos às horas nem aos dias iguais. O que será preciso para enganar as paredes do mundo? Para que elas caiam com ternura nos lagos das nossas vidas? Como provocar o curto-de-circuito fatal da reunião dos sóis? É isso que me cala as palavras e me adormece nos silêncios. Um mais um dá dois, mas o que acontece quando a conta não acaba e acabamos somando um mais um, mais um, mais um, mais um... até ao infinito? Um grande vazio provocado pelo que devia acontecer, esse vazio indignado que anseia secretamente a sua morte. Tão triste, tão sozinho e cansado. Cansado como eu, minha querida. Reorganizar os astros e continuar a vidinha. Rodear o que criaste propositadamente para esquecer, porque como dizes: não te sabes dar – o que é mentira. Porque tu dás-te em demasia, és tão gratuita que dói. Dói-te a ti e nos outros que te recebem sofregamente. Observa como eu te conheço tão bem, pensas que é obra do acaso? Encheste-me de ti com grandes rajadas furiosas! Mas como vento passas, esqueces e levas. Inocente maldade que espalhas pelo mundo, meninez violenta em brincadeiras de adultos. E agora que faço de ti? Nada, pois deixo-te ir da mesma maneira que chegaste. O encontrão que dei em ti foi do sonambolismo louco, mas que dizer das tuas intenções ao me deitares e me aconchegares com amores? É isso, és uma enfermeira doente. É má política cuidares de doentes quando tu própria sofres. É fácil prever que ainda vais enganar muito soldadinho que te vê como um semelhante – loucos na doença -, as afinindades serão muitas e tu adorarás isso. Não é assim? O engraçado é que depois de curado o doente, tu continuarás enferma, com uma febre imperturbável, mas sempre amável e volátil. Até ao dia em que alguém te irá alvejar mesmo entre a alma e os pulmãos, quebrando toda a tua seriedade. Nesse dia todo o ar que escondeste voará da tua boca e o amor cairá - ali - nas mãos do teu agressor, e não dirás mais nada nem sorrirás de alegria. Perguntar-te-ão a razão da infelicidade e tu apenas dirás “Sou muito feliz, finalmente encontrei alguém que me ama.” E tu algum dia amarás por inteiro? Para ti o derradeiro amor será uma fatalidade insuportável para o teu orgulho. Por isto e pelas sombras indecifradas, não forçarei mais, por agora... que não quero matar-te sem que me mates primeiro. Enquanto isso andemos mais um pouco lado a lado, marchemos à procura do maravilhoso acaso; o nosso acaso. Pode ser que um dia disparemos o “tiro” ao mesmo tempo. Mas antes de ir ali e já voltar – e peço-te que não sejas um esterco com pernas -, por favor diz-me que nome há depois de Maria?

Anónimo disse...

Sabes o que vejo na tua escrita? Desespero, um desespero convulsivo e solitário; e talvez seja isso que hipnotiza ao ler-te: a beleza do teu desespero. Acho que é a explicação para a aura extraordinária das tuas palavras. E agora uma pergunta que me assaltou o espírito, que assentou como um grão de pó na minha mente e que por mais que sacuda não sai: “Mas afinal quem és tu?”

Não respondas já. Anota a pergunta num papelinho e mete-a na carteira, ou noutro sítio de fácil acesso para que possas levá-la contigo. Quando te lembrares dela, observa-a e lê-a atentamente. Repete isto quantas vezes achares necessário, que seja instintivo, até que a resposta te surja como um orgasmo: rápida, alucinante, inelutável. Nesse momento - e só nesse momento – responde-me. E não tenhas pressa, pois não me importo de esperar meses. Quero que a resposta te surja como uma certeza absoluta.

Por agora apenas posso dizer que és CALEIDOSCÓPICA.

p.s. Se responderes já, juro-te que arranjarei maneira de partir-te as pernas e fechar-te num quarto pintado de branco com apenas uma janela, fora do teu alcance, onde só verás o céu. Nesse quarto colocarei um espelho para que possas observar-te todos os dias (o único objecto do quarto). Terás toda a liberdade para não te olhares ao espelho mas lembra-te que o teu reflexo será a tua única companhia e que tens as pernas partidas, o que tornará penoso qualquer movimento. Não sentirás fome nem sede porque o quarto estará situado fora da realidade. O objectivo deste “jogo” ser-te-á revelado quando descobrires o objectivo do “jogo”.

mary disse...

A sério que sim? Que grande alegria que me dás, doce Maria.
As tuas palavras são beijinhos na alma!!

efeito placebo disse...

A inspiração acontece-me neste amor que tenho na escrita de que te fazes senhora...

efeito placebo disse...
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