quinta-feira, 3 de abril de 2014

231.



Eu calco aliterações que como facas me cortam. Fendeu-se algo de inútil e por isso os soalhos rangem.
Ouve-se falar da anatomia do caos, como se o caos tivesse um corpo
cheio dos medos e das tragédias dos Homens. A insolúvel revolta dos pensamentos, dir-se-ia.
Transversalmente recordo e digo: "as periferias de um olhar são só destroços de guerra."A eterna e imprudente batalha entre o corpo e as suas desconhecidas órbitras desorganizou os astros.
As pedras.
O lugar onde te recolhi como a um animal ferido. O irremediável sabor da perda, das folhas outonais que se transformaram em pegajosas memórias. As palavras que se partiram. Deixei de saber o tom
da tua voz quando dizia "olha, estas são as costas de onde poderás ver o mar.", deixei
de reconhecer os antigos vestígios de petróleo na tua pele. E o rosto,
este rosto
mapeou-se de frágeis povoações de insectos, antigas colecções de mármores, soluços. Mas eu tenho ainda a virilidade do chão e o alívio,
o alívio de as mãos serem ainda este lugar de fertilidade.

Margaret, 2 de Maio 1979

2 comentários:

Anónimo disse...

Não sei o que te dizer perante tais palavras.

Jessica disse...

Que maravilhoso é ler-te Maria, a tua escrita é capaz de aquecer corações até nas mãos de Dezembro :)