Entre a dúvida e a palavra
acelero como quem se sente capaz
finalmente [
de um despiste
Estar contra os astros significa apenas
que trazemos no sangue uma porção
de nitrato
invariável
dolorosa, sem dúvida
irascível
A salvação não se encontra nos
olhos de alguém
[ainda que radicalmente belos
não se encontra num ou outro beijo aceso
não se encontra num certo modo de posicionar
a bacia ou o anelar ou a omoplata
Nem sempre havemos de ter força
às vezes cairemos e o levantar não terá
lugar no momento seguinte
Antes demorará, como se demora a mágoa
na particular cisura do coração
ou a mansa água de um rio antigo.
Não te maldigo, querido. Não te estranho.
A minha pena é sede do nome que me
deram sabendo e não sabendo
os motivos que o encerram
que o impelem à substância última
à ruptura advinda da dor
da maresia
de um gesto atrasado ou por completar.
A impressão das tulipas
a sua vermelhidão enjoativa
o sorriso que desprendem no jarro
paliativo assassino falacioso
oh, sim, a impressão que ficou
depois do amor igual a essas tulipas
a observar-nos os movimentos
com a sobranceria de quem olha
alguém desde cima.
O terrível ângulo, essa fraca forma
de insistir no fúnebre sentido que se tornou
a paixão o seu cavalgar o arquear de umas coxas
outrora prontas para milagres que no fim de contas
terminaram desconhecendo
Ainda não me levanto. Ainda me deixo ficar
um pouco abaixo do solo
na rarefeita paisagem da memória
próxima das raízes das tulipas por arrancar
da terra
como fetos que se conservem no útero
materno
um pouco abaixo de mim mesma, sim [
um pouco abaixo da palavra e da fé
Mas não te maldigo, querido. Não te estranho.
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