quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

270.


bookoffixedstars:
“ Banded demoiselles laying eggs on a floating island of aquatic vegetation. Photo by Władysław Strojny (1923 - 1992).
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”

Amor, devias vir.

Uma árvore é, por vezes, razão suficiente.

Em dias mais oblíquos, a memória da sua seiva

a retinir em nossa pele ainda morena

ainda pronta para a vida,

num Verão possível e perdido.

Mas o amor demora-se, sim, como

reiterando a sua dissonância,

que é a sua forma de ser fugaz cruelmente.

Em certos dias, demora-se o mais

que já esperamos

[sempre.

Éramos frescos, sem dúvida.

Na algibeira havia um pedaço de pão

e uma noz a morder contra a fome.

Havia, sobretudo, a ingenuidade 

dos cães vadios,

do seu latir persistente,

do doce modo como posicionam o seu corpo

apesar de faminto

apesar de gelado.

Eu queria um destino mais belo, sim.

Os rapazes partem para Julho como

para uma grande promessa.

A juventude vai-se deteriorando,

parecendo-se cada vez mais

com um vidro quebrado.

As mãos já não possuem 

virilidade alguma. As tulipas vermelhas

aonde ficamos despenhadas 

como na nossa própria menstruação.

Os rapazes partem ainda, partem sempre.

Amor, devias vir. Devias procurar

o âmago aonde late outra coisa

aonde sou outra coisa

mais afoita a ti e às tuas medidas. 

Mas tu desconheces. E desconhecendo-me,

sem saberes, amas-me menos.

É sempre menos o dia em que acordámos,

mesmo depois da paixão

e do frio aconchegado em dois corpos.

Saber olvidar, por certo.

Dar um passo que não seja em falso.

Observar o vidro

a forma como se quebra

como se quebra

em nossas mãos.

Amor devias vir,

[se não fosse já tarde.





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