terça-feira, 13 de dezembro de 2016

258.


vintagephotolibrary:
“ Sebaste: Eglise de St. Jean-Baptiste
”


É sempre colérica a dor de uma casa, digo.
Eu nasço e renasço sem cessar
como se procurasse o estado da mais imprecisa identidade,
isto é, um sentido aonde os astros venham morrer.
Há sempre uma beleza de mulher a auscultar
a fraqueza e o vexame e o desdém;
um fotograma tremido dos dias solarengos
dos dias femininos da juventude e do crime
dias de abismal beleza materna, como um alfinete
esquecido numa bainha.
Eu tenho vontade de chorar contra a mesquinha
brutidão, contra a frieza que é fraude e disfarce,
eu tenho vontade de esmurrar o que sobeja
das redundantes águas de Julho.
Pouso as mãos no espelho prosaico e gasto e
todas as coisas se abrem em póstuma fé,
feitas apenas de agudas insinuações com que
eu vou distraindo o pão já duro da semana.
Revisito para adular o tédio o ventre que trago mordido
e sinto o sangue consumir-se dentro da casa,
casa que sofre com uma carne muito acesa e enferrujada,
casa já sem mãe possível.
Fechada a porta, digo, as florestas complicam-se
numa insistência matinal, como querendo dizer:
«Tenho o sexo molhado de pus e velocidade,
como hei-de eu viver com o sexo molhado
de pus e velocidade?»
E é sempre com um olhar cansado, medonho,
que alcanço o que ficou por responder, como
pedra encravada na maldade do sonho.
Se me acariciares as mãos reconhecerás
quantas foram as vezes em que minha boca
se saciou com o pecado, tão suja e imprópria.
Se parares um momento saberás que do delito
não emergiu arrependimento algum, mas só
este breve anseio de ser delirante e cruel
  [eternidade fora.

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